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Justiça: Defesa quer tribunal colectivo no julgamento da suposta “máfia” de terrenos na Praia

Persiste uma certa indefinição em relação à composição do tribunal que deverá julgar os 15 arguidos do mega-processo relacionado com a suposta “máfia” de terrenos na cidade da Praia. A defesa quer que o caso seja julgado por um tribunal colectivo, mas o juiz do terceiro juízo crime tem uma posição diferente. De fora da lista de arguidos ficaram três antigos presidentes da Câmara Municipal da Praia. O julgamento, que deveria começar na próxima segunda-feira, 6, foi adiado para o dia 27 deste mês.

Segundo A NAÇÃO pôde apurar junto de uma fonte judicial, os advogados de defesa dos arguidos alegadamente envolvidos no caso “Máfia de terrenos da Praia”, com destaque para figuras públicas como Arnaldo Silva, Rafael Fernandes, Alfredo Carvalho e a empresa deste, Tecnicil, requereu que o julgamento seja realizado por um tribunal colectivo.

Conforme o nosso interlocutor, o requerimento apresentado pela defesa desses arguidos foi liminarmente indeferido pelo magistrado judicial Antero Tavares, que considera que este processo pode ser julgado apenas por um juiz. Os advogados discordaram e optaram por avançar com um recurso à decisão desse juiz.

Razões de novo adiamento

Contudo, esse julgamento, que deveria começar no dia 6, próxima segunda-feira, foi adiado para o dia 27 deste mês. Esse adiamento, motivado por outras questões processuais,permitirá, no entanto, que haja uma clarificação no sentido de se poder saber se o julgamento será feito apenas por um juiz ou por um tribunal colectivo, como é desejo dos advogados dos 15 acusados de burla qualificada, lavagem de capital, associação criminosa, falsificação de documentos e corrupção activa.

A nossa fonte considera, no entanto, que a pretensão da defesa em requerer um coletivo de juízes para o julgamento desse caso é “legítima”. De acordo com o Código de Processo Penal, basta a moldura penal de um crime ser superior a oito anos para ser possível constituir um tribunal colectivo.

A NAÇÃO sabe que na base da decisão de adiamento dessa audiência está o facto de os oficiais de justiça não terem conseguido notificar pelo menos dois dos 15 arguidos do processo de julgamento da “máfia” de terrenos da Praia.

De acordo com a lei, a notificação de arguidos deve ocorrer com vinte dias de antecedência, o que não aconteceu, razão pela qual a sessão de audiência de julgamento, antes agendada para o dia 6 de Junho, teve de ser adiada para o dia 27 do mesmo mês.

Todos vão para julgamento

Em Dezembro do ano passado, o juiz Alcides Andrade, do terceiro juízo-crime, após Audiência Contraditória Preliminar (ACP), decidiu encaminhar todos os arguidos para julgamento do megaprocesso da venda ilegal de terrenos da Praia.

Durante a ACP, Alcides Andrade entendeu que a polémica matéria que tinha em mãos só será resolvida em sede de julgamento, pelo que achou que deveria mandar todos os arguidos à audiência de julgamento.

A ACP, que foi requerida em Março de 2020, pretendia chegar a um entendimento com os queixosos de modo a evitar que o processo chegasse às barras do tribunal para julgamento, arriscando condenação a pena de prisão e indemnizações.

Usurpação, comercialização ilegal e criminosa de terrenos

Esse requerimento foi interposto pelos arguidos Alfredo Carvalho e Tecnicil, acusados juntamente com mais 12 entidades por vários crimes relacionados com a usurpação e comercialização ilegal e criminosa de terrenos na cidade da Praia requereram uma Audiência Contraditória Preliminar (ACP).

Alegaram, na altura, que o Ministério Público (MP), “sem nunca ter querido ouvir previamente o arguido”, deduziu contra estes a acusação de um crime continuado de burla qualificada, outro continuado de falsificação de documentos agravada, um crime de organização criminosa, um crime continuado de corrupção activa, assim como dois crimes de falsidades informática e um de lavagem de capitais agravado.

A defesa de Alfredo Carvalho argumentou, na ocasião, que “o magistrado subscritor se escuda em documentos soltos recolhidos, mas que não conseguiu interpretar correctamente, na exacta medida por não perceber o modelo de negócio e a estratégia das empresas e, sobretudo, por se ter deixado levar por uma peregrina teoria conspirativa só imaginável por uma mente impossível de se qualificar”.

Os advogados de defesa entenderam, igualmente, que o juiz deveria ordenar o arquivamento dos autos após a ACP e que a dedução da acusação contra o arguido, sem ser previamente ouvido e constituído arguido, “constitui nulidade processual insanável, por violação do princípio do contraditório e o direito de defesa”.

A defesa da arguida Tecnicil também tinha afirmado, no seu requerimento, que queria provar em sede da ACP que, entre vários pontos, é “totalmente falsa” a conclusão e a afirmação do MP que alguma vez aquela empresa ou o seu presidente, ou qualquer um dos seus sócios, tenham participado em qualquer “sociedade de fachada” para cometer um conjunto de ilegalidades.

A defesa da Tecnicil pretendia provar que a sua constituinte e o arguido Arnaldo Silva apenas “tem e manteve” relações puramente profissionais e que, portanto, “nunca houve” entre eles, “nem com os demais arguidos”, qualquer tipo de organização com vista a prática dos crimes de que a empresa é acusada.

Câmara da Praia no centro de um esquema fraudulento

A Câmara Municipal da Praia (CMP) é tida como um dos principais veículos da “mega burla” de terrenos na capital do país, envolvendo o advogado Arnaldo Silva, o empresário Alfredo de Carvalho e o vereador Rafael Fernandes, como principais protagonistas.

Entende-se, igualmente, que os sucessivos presidentes da CMP (Jacinto Santos, Felisberto Vieira e Ulisses Correia e Silva) não terão defendido convenientemente os interesses da autarquia.

Nas entrelinhas do despacho do Ministério Público, de 90 páginas, de Março de 2020, que deduziu a acusação contra suspeitos de um esquema fraudulento de venda de terrenos na cidade da Praia, ficou a ideia de que os sucessivos presidentes da CMP, Jacinto Santos, Felisberto Vieira e Ulisses Correia e Silva, tinham conhecimento da ilicitude do negócio, mas nenhum deles terá tido o cuidado de defender os interesses da edilidade.

Contudo, nem Jacinto Santos, nem Felisberto Vieira, assim como Ulisses Correia e Silva foram constituídos arguidos. Conforme uma fonte judicial, essa foi uma estratégia para evitar que o processo fosse politizado, o que poderia perigar o seu desenrolar.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 770, de 02 de Junho de 2022

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