Sao Tome
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Nem o André Ventura e o CHEGA foram tão longe

«…Vou dar alguns códigos para que vocês possam interpretar o que está a acontecer em S.Tomé e Príncipe. Logo a seguir ao golpe, logo a seguir àquela inventona, que provocou a morte de 4 cidadãos de S.Tomé e Príncipe, o primeiro-ministro, para onde é que viajou? Viajou para o Príncipe. O que é que tudo isto tem a ver? Perguntar-me-ão, o que é que isto tem a ver? Ele viajou para o Príncipe porque sabia que um dos mortos era natural do Príncipe. Perguntar-me-ão, o que é que isto tem a ver?

Viajou para o Príncipe porque sabia que um dos mortos era natural do Príncipe e ele precisava de ganhar simpatia para que não houvesse agitação. Foi para o Príncipe para contactar com quem? Para contactar com o Presidente do Governo Regional. Mas quem é este Presidente do Governo Regional? Foi alguém que foi introduzido para governar o Príncipe pelo Presidente do Governo Regional anterior que em vários momentos esteve em sintonia com o atual primeiro-ministro.

Este Presidente do Governo Regional do Príncipe que não tem nenhuma ascendência do Príncipe, nasceu, por acaso, no Príncipe, e não representa em nada os interesses do Príncipe. Dou-vos um exemplo, para vocês entenderem de novo, por que razão que eu digo isto e por que razão o primeiro-ministro viajou para o Príncipe. Porque uma das pessoas que estava a bater o Arlécio é natural do Príncipe e é de origem Caboverdiana. Interessava ao senhor primeiro-ministro convencer ao Presidente do Governo Regional que, por sua vez, é um Caboverdiano (ninguém tenha dúvidas que ele é um Caboverdiano) e que apenas representa os interesses de Cabo Verde e não representa os interesses do Príncipe.

As pessoas do Príncipe estão a ser enganadas por um indivíduo que não representa os interesses nenhuns do Príncipe e não conhece o Príncipe. Não é por acaso que ainda na recente visita do Presidente da República de Cabo Verde, bem como de outros presidentes, têm-no levado também nas comitivas. Há interesses que estão aí que nós temos de por fim a estes interesses. S.Tomé e Príncipe tem de voltar a ser governado por gentes de S.Tomé e Príncipe. Nada de gentes que não tenham afinidades.

Por isso, eu até desempenharia, se tivesse condições, os dirigentes de S.Tomé e Príncipe deveriam ser submetidos a um teste de ADN para nós percebermos se são de facto filhos de gente de S.Tomé e Príncipe ou não. Porque, ao que parece, não serão, com certeza, filhos de gente de S.Tomé e Príncipe. Podem ser, até, pessoas que tenham sido adotadas, vamos recuar no passado para vermos se estas pessoas são, de facto, de S.Tomé e Príncipe, porque aquilo que tem acontecido em S.Tomé e Príncipe, neste momento, não se compreende que as pessoas tenham este carácter. Por aquilo que tem acontecido, neste momento, em S.Tomé e Príncipe, não me parece que estas pessoas que governam S.Tomé e Príncipe tenham sangue de gentes de S.Tomé e Príncipe.

O Santomense, por natureza, é humano, e aquelas pessoas que estão a governar, do Príncipe a S.Tomé, não são gentes humanas. Só por isso é que nós nunca ouvimos o Presidente do Governo Regional a falar porque o seu conterrâneo de origem Caboverdiana é que esteve a mutilar o nosso cidadão Arlécio Costa. Por isso, meus caros, reflitam bem nas próximas escolhas de governação, Exijam teste de ADN. Nós temos de começar a exigir teste de ADN para sabermos se são Santomenses. E vou dizer-vos mais: podem não ter lido com tanta firmeza o relatório de polícia judiciária mas, se forem ler, vão ver que referem que os membros inferiores dos quatro homens que foram torturados tem uma perfuração feira com baioneta de AK47. Aquelas perfurações, quase que seriam cópia a papel químico. Não vos diz nada? Tal pode ser, até, um ato satânico e que nós estamos a descurar. Nós temos que prestar muita atenção ao que está a acontecer em S.Tomé e Príncipe…» Fim da transcrição.

Desenganem-se! Não foi André Ventura que disse aquilo que está expresso na transcrição anterior. O que acabaram de ler não foi um discurso do líder do CHEGA, André Ventura, nem tão pouco representa um sermão evangélico de nenhum pastor. Este excerto resulta da transcrição do conteúdo de um vídeo que muitas pessoas me enviaram convidando-me a comentar ou escrever sobre o mesmo. A transcrição que fiz é tão fiel quanto possível e evitei corrigir erros, de natureza sintática ou semântica, do referido registo oral, para não adulterar o conteúdo da mensagem que o autor do referido vídeo quis transmitir. O autor do mesmo é um cidadão Santomense que se autointitula de analista político, “Principense Puro” e defensor dos direitos humanos. Serei parco nos comentários sobre o conteúdo da referida mensagem, expressa no vídeo em causa, deixando esta tarefa ou desafio para os leitores, porque está lá representado, todos os perigos, de forma declarada e assumida, que alguns sectores da nossa sociedade decidiram galgar. Todavia faço apenas três considerações:

  1. Como é possível que alguém que se autointilula de analista político e defensor dos direitos humanos possa manifestar, em contradição com este título e com o seu próprio percurso de vida, tanta intolerância, tanto ódio e tiques de xenofobia? Bastava, para tal, que o referido analista e defensor dos direitos humanos lesse, com algum criticismo, a declaração universal dos Direitos Humanos, designadamente o seu artigo 2, para que desse conta do ridículo em que caiu.
  2. Como é possível que alguém que não tendo ascendência portuguesa, nem tão pouco tenha nascido em Portugal, ao contrário daquilo que aconteceu com o atual presidente do Governo Regional da ilha do Príncipe, que nasceu no Príncipe, tenha a ousadia de querer impedir o atual presidente do Governo Regional de exercício legítimo desta função na ilha do Príncipe, e, no entanto, o próprio, tenha feito parte das listas do PSD, nas autárquicas de 2017, para a Câmara Municipal de Lisboa, onde o referido partido teve a maior derrota da sua história na referida autarquia? Não tendo ascendência Portuguesa nem tendo nascido em Portugal pôde concorrer para um cargo de grande relevo político em Portugal e, no entanto, acusa e quer impedir o outro, que é natural da ilha do Príncipe e lá nasceu deste mesmo propósito ou ambição. Os Direitos Humanos que o cidadão em causa defende só são para si?
  3. Como é possível que alguém que acusa o atual presidente do Governo Regional do Príncipe de não conhecer o Príncipe, num exercício de manifestação de mesquinhez, intolerância, soberba e xenofobia inusual, e, no entanto, com apresentação da sua proposta para que, a partir de agora, todos os potenciais dirigentes ao exercício de cargos políticos no país devam realizar testes de ADN para o cumprimento deste propósito, revela desconhecer, totalmente, a História de S.Tomé e Príncipe e, particularmente, do Príncipe? No limite, ele mesmo, perante a sua receita radical para seleção de “indivíduos puros” para o exercício de governação das ilhas, poderia correr o risco de não estar habilitado para este propósito.

Nem o André Ventura e o CHEGA em Portugal foram tão longe em termos de criação de estereótipos, caracterizadores de nós e eles, tendo como suporte o comportamento, a cultura e a proveniência de “grupos” que sustentam a nossa diversidade como país, supostamente baseados numa herança genética inalterável.

Camilo Domingos, embora nos tenha deixado muito cedo, que foi da geração  deste senhor que se autoproclama de “Principense Puro”, estando nas mesmíssimas condições do atual Presidente do Governo Regional do Príncipe, pois, os seus pais eram Caboverdianos, fez muito mais pela projeção internacional da cultura de S.Tomé e Príncipe, e particularmente do Príncipe, do que este senhor fará em toda a sua vida. Não conheço outro cantor Santomense, que tenha “musicalizado” e cantado, com tanta perfeição, pelo menos na minha opinião, a Puita e Dêxa que é tocada e dançada um pouco pelas discotecas de muitas partes do mundo, como o Camilo Domingos fez. Qual é o critério de “pureza”, afinal, que este senhor usa para caracterizar aqueles que se consideram como Santomenses? São os dele? É ele que define esta “pureza”? São os testes de ADN que garantirão esta “pureza”? Santa paciência!!!

Quem se autointitula de analista político e defensor dos direitos humanos deveria conhecer as consequências destes disparates, difundidos de forma irresponsável nas redes sociais, tendo em conta, até, aquilo que todos deveríamos aprender com os fatídicos acontecimentos do genocídio que aconteceu em Ruanda em 1994.

Adelino Cardoso Cassandra

15/04/2023